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QUANDO UMA AVE É UMA RARIDADE MAJESTOSA


Bonelli's Eagle, a majestic rarity


UMA RARIDADE MAJESTOSA

A ÁGUIA-DE-BONELLI


As aves sempre me fascinaram. Desde de criança, por aquilo que me contaram, que este encantamento, mexe comigo. Primeiro a paixão por todas as aves da família Anatidae (patos, gansos ou cisnes). Mais tarde, os pássaros no seu sentido mais amplo. Na verdade é um fascínio que não sei explicar. Se os animais de uma forma geral, são algo que estão associados a toda a minha vida, as aves têm feito parte dela, sempre de uma maneira especial.
Este artigo, é a minha primeira homenagem a esta classe (as aves) magnifica de seres vivos, que tão poucas vezes é dignificada no nosso país, apesar das excepções que existem são profundamente meritórias. Dedico-a a uma extraordinária ave de rapina que nidifica em algumas das regiões de Portugal. 
O estatuto Fenológico (Fenomenologia, área da ecologia que estuda o comportamento dos seres vivos perante as condições ambientais): Residente.


A Águia-de-bonelli, também conhecida como Águia-Perdigueira, faz parte do atlas das aves de rapina que usam o nosso território para procriarem. Uma boa parte delas adaptaram-se e depressa se tornaram residentes, devido à natureza geográfica do país. Com cerca de quatro dezenas de espécies de aves de rapina entre as mais de 600 variedades de aves que ocorrem em Portugal, destaco para este artigo aquelas que melhor podem situar esta espécie entre as demais: Águia-rabalva - Haliaeetus albicilla (ameaçada de extinção), Águia-cobreira - Circaetus gallicus, Águia-gritadeira - Aquila clanga (não residente e rara), Águia-pomarina - Aquila pomarina (não residente e rara), Águia-imperial-ibérica - Aquila adalberti (fortemente ameaçada de extinção), Águia-real - Aquila chrysaetos e a Águia-calçada - Aquila pennatus Todas estas aves pertencem à família das Accipitridae. A Águia-de-bonelli está identificada como a quarta maior das águias que nidificam no nosso território.
A observação destas espécies de aves é tida como uma das mais extraordinárias experiências do contacto com a vida animal.

A bonelli infelizmente, encontra-se no nosso país em perigo de extinção e por isso   classificada com o estatuto de rara. No livro vermelho dos vertebrados de Portugal continental, considerada “Em Perigo - EN”, tal como na nossa vizinha Espanha . Os esforços para a conservação desta espécie na Europa, dado outras ocorrências semelhantes, foram definidos com medidas prioritárias, mesmo sendo o seu estatuto de conservação em termos globais considerado “Pouco preocupante – LC”. Mas a verdade é que, este declínio na Península Ibérica tem-se se acentuado nos últimos anos em consequência do acumular de diversas ameaças das quais falarei mais à frente, no final do artigo.


Taxonomia: Classificação cientifica da Águia-de-bonelli (Aquila fasciata, 1822)

-      Existe uma subespécie (A. fasciata renschi /1932), que não está inteiramente definida a sua taxonomia em termos de concordância científica de acordo com os estudos dos geneticistas. Há quem levante a dúvida de se tratar de uma espécie própria. Habita exclusivamente, as Pequenas Ilhas de Sonda, a sul do arquipélago Malaio.


Trata-se de uma águia de estatura mediana, com uma caracterização morfológica que a distingue das restantes. Com cerca de 55-60 cm de comprimento, pode ter uma envergadura em voo entre os 150 e os 180 cm, e pesar 15/16 a 24 kg. A plumagem desta ave torna-se facilmente identificável, visto ter características muito próprias; com asas não muito grandes em tons castanhos escuros e alguns mesmo pretos, a parte inferior do corpo branca ligeiramente pintalgada de penas castanhas e uma cauda também castanha longa e direita com a extremidade negra, identifica-se melhor pelo dorso branco cercado pelo resto da plumagem castanha. Sabe-se que em voo a uma certa distância pode ser confundida por outras, talvez por essa razão, o dorso e o negro nas asas e cauda sejam a melhor forma de precisar a espécie quando observada. É um paralelo que se dá em voo, por vezes a alguma altitude, com o da Águia-real (entre outras), detectável apenas e frequentemente pelas penas na ponta das asas que são reviradas para dentro. As crias ainda juvenis, conseguem-se destacar mais facilmente, pois as asas depressa se tornam castanho escuro em contraste com o restante do corpo de penas mais acobreadas e cor de mel. Um processo que leva perto de 4 a 4 anos e meio adquirir os padrões dos progenitores ou das aves adultas.


Alimenta-se do que consegue caçar. Porém a sua fonte de subsistência baseia-se por necessidade entre coelho-bravo, perdizes ou diversos tipos de columbiformes (pombos e a fins). Contudo dada a sua dedicação familiar, não rejeita quando tem de ser, presas como pequenos roedores ou mesmo repteis.

Por falar em família, essa é uma das componentes etológicas que mais me fascina nesta espécie. Espécie monogâmica, estabelece um processo de interajuda e organização perfeitos na preparação da sobrevivência adversa das suas proles, com uma média de duas crias em cada época de acasalamento, ao longo da vida em comum. O macho, por norma, é quem se responsabiliza pela alimentação; enquanto a fêmea cuida dos pintos, como vulgarmente são conhecidos e da higiene do ninho (que quando construído nas escarpas rochosas pode atingir os dois metros de diâmetro). Sendo uma ave muito territorial,, não permite aproximação de outros casais por perto e menos ainda de outras espécies de aves de rapina, concretamente da Águia-real, que pela sua natureza comportamental utiliza as mesmas áreas de nidificação e condições geográficas. Calcula-se que essa proximidade pode distar até cerca de 7 km. Uma das particularidades que mais me surpreende, é o facto de construir vários ninhos no seu território e que os vai alternando de postura para postura. Como exemplo do fascínio etológico desta espécie, podemos dar o exemplo de um casal que nidifica na Tapada de Mafra, no distrito de Lisboa,  há 22 anos… Mantem as suas rotinas de subsistência e procriação; que tem gerado normalmente uma cria por cada época, salvo a excepção em 2014, que conseguiu com êxito a sobrevivência das suas duas crias. Um excelente exemplo de fidelidade animal e sucesso reprodutor.




O período de corte, das paradas nupciais, começa por volta de meados de Dezembro, e estende-se em voos extraordinários de acrobacias estonteantes ou círculos espantosos até meados de Fevereiro. Altura em que é iniciada a preparação de um novo ninho aconchegado, no principio com folhas frescas e no final com uma almofada de penas. A incubação dura até ao inicio da segunda quinzena de Abril, cerca de 40 dias em que a fêmea com o bico vai girando e ajeitando os ovos. As crias nascem brancas e cobertas de penugem. Perante os estudos feitos, sabe-se que há casais com 4, 5 ou mesmo 6 ninhos construídos por eles nas proximidades. Com perto de dois meses já ficam sozinhas grande parte do tempo. Isto se o fratricídio não acontecer, facto comum entre estas espécies e outras aves… em que a cria (ou as crias) mais desenvolvida escorraça do ninho a outra ou mesmo em alguns casos acabando por a matar. Em Julho já a maioria dos juvenis está capaz de voar. Mas só por volta dos meses de Setembro ou Outubro estarão prontas para deixar o territórios dos seus progenitores, e capazes de caçar ou dominar a capacidade de voo, o que geralmente vem acontecer no final de Outubro.

Etologicamente, são conhecidos dois tipos de processos na topologia usada na nidificação: as suas populações tanto podem ser arborícolas (que usam as árvores) ou rupícolas (que utilizam geralmente aos relevos e escarpas em zonas rochosas). É com esta ordem que se estuda hoje a especificidade genética desta ave, fundamentando-se no seu habitat geográfico e que leva a uma clara demarcação da sua distribuição em termos de populações como igualmente da evolução ou  diferenciação genética. E esta evolução ecológica estabelece-se mais na população arborícola, com os reprodutores a fixarem-se em novas áreas florestais ou de topologia arbórea ou de casais de nidificação rupícola a deixarem as zonas rochosas e à adaptarem-se a zonas arborizadas. E ainda a fixação dos sub-adultos ou exemplares numa fase imatura.

A beleza do voo planado desta deslumbrante ave.

A distribuição mundial desta espécie estende-se desde a Indochina (entre o leste da India e o sul da China, que inclui países como o Laos, o Vietnam, Camboja, Malásia, Singapura, parte da Tailândia ou mesmo Myanmar), o sul da Ásia e Médio Oriente. No continente africano encontra-se desde o norte ao sul do Saara até à chamada bacia do Mediterrâneo. No que é definido como Paleárctico (Europa, Norte de Africa, parte significativa da Arábia, e toda a Ásia a norte dos Himalaias), esta espécie está circunscrita à região ocidental, na zona mediterrânica (entre Portugal, Espanha, Itália, Grécia, França, Albânia, Chipre, Croácia, Turquia e a Bulgária). Mas é na Europa que o seu declínio populacional tem decrescido perigosamente, principalmente, na região mais ocidental do continente Europeu, situando-se entre a França e a Península Ibérica as condições para o perigo de extinção nestes territórios.
As populações em Portugal estão distribuídas pelo nordeste transmontano, na Beira baixa, no interior Alentejo e no serrano algarvio. De forma mais dispersas ao longo da zona litoral até ao sudoeste alentejano/costa Vicentina, incluindo, tal como tanto a norte como a sul dos estuários do rio Tejo ou do rio Sado. Contudo, sabe-se pelos censos mais recentes que encontrei (datados de 2005, 2009, e estudos de 2011), não existirem casais ou populações fixas no norte de Portugal, com a excepção da raia transmontana através das arribas da bacia hidrográfica do Douro que se expande ao longo do Douro internacional, descendo até ao vale do Côa. Apesar das excelentes condições termófilas das encostas, e dos sistemas biótipos existentes (vinhas, olivais, azinhais, sobreirais ou montados, matos, pastagens e zonas cerealíferas), estas populações têm vindo a decrescer. Como aconteceu com um dos casais residentes no Côa que desapareceu, e que já era seguido desde 1993. Os factores são muitos e diversos mas como já referi voltarei a eles mais à frente.

Os últimos censos, estudos de campo e monitorização ou estudos genéticos realizados registavam pouco mais de 120 casais nidificantes em Portugal. Enquanto em território espanhol (desde o Sudoeste, Oeste, Centro e Este de Espanha) foram identificados cerca de 750 casais. Sem que tenha qualquer relevo, um ou outro casal, apesar de se encontrarem registados nos censos nacionais acabaram por nidificar para lá da nossa fronteira. A maioria destes casais situam-se no sul do país. Desde a região do Tejo internacional (5 casais), Bacia média do Rio Guadiana (9 casais), Bacia interior do Guadiana (20 casais), Sudoeste Serrano (36/38 casais), Bacias inferiores do Rio Tejo e do Rio Sado (4 casais) e região da Grande Lisboa e Oeste (7/12 casais)… Num calculo que pode rondar os 88 casais; isto se estes números se mantiverem no presente, visto que há casais que provavelmente abandonaram os locais de residência e os quais não estão ainda confirmados os seus regressos aos locais de nidificação. Os restantes casais, cerca de 20 a 25, situam-se como já indiquei a norte do Tejo, concretamente no zona de Trás-os-Montes e Alto Douro até à Beira Baixa Interior.


Os objectivos do programa global de protecção a este espécie, como outros, é ambicioso de acordo com a sociedade que temos, mas essencial. As ameaças recorrentes à sua conservação são muitas e bem espelhadas nos exemplos dados nos planos de acção, seja pelo Centro de Estudos da Avifauna Ibérica (CEAI), como na Rede Natura 2000, o Projecto LIFE ou de outras instituições envolvidas neste processo. A mortalidade nos efectivos existentes podem ser controladas e minimizadas, para isso basta monitorizar e encontrar medidas preventivas para impedir o desabamento dos ninhos; o controle de epidemias como a  tricomoníase; melhor gestão e protecção das redes eléctricas e dos parques eólicos; educação e aplicação de leis mais duras no abate ilegal; igualmente evitando a degradação do habitat, seja pela reflorestação das matas, pelas penalizações no abate de árvores de grande porte, como na promoção do crescimento das populações columbófilas rurais protegendo e mantendo activos muitos dos pombais rurais abandonados ou degradados; tal como usar sem medos instrumentos que criem responsabilidades agravadas na contaminação químicas dos solos e águas, estender de forma abrangente a difusão de dados informativos de como podem ser evitadas as perturbações no período critico da reprodução, isto para além de demarcar definitiva e claramente a classificação de áreas protegidas e prioritárias.

Na essência, seria já bastante que entre todas estas medidas proteccionistas, algumas pudessem ser assumidas como fundamentais no papel que todos podemos ter, directa ou indirectamente.
É por isso que sublinho, na minha perspectiva e sem excluir outra alternativas, que precisamos de: coordenar melhor a gestão do habitat a nível nacional criando condições para envolver e sensibilizar a sociedade civil e adaptar as actividades económicas na conservação do ambiente e da biodiversidade existentes nas áreas afectas a esta espécie. Se for necessário, criar legislação ou directivas que promovam a protecção de todas as espécies endémicas no nosso território. Também me parece claro que, para sustentar ou fundamentar estes imperativos, creio que os censos sobre as espécies em perigo como todas as outras que se interliguem nesta relação deveriam ter periodicidades muito mais frequentes (caso fosse necessário recorrer ao apoio escolar e educativo, mesmo a partir do 1º ciclo, nestes levantamentos, incluindo por exemplo envolver estas e outras populações no processo de marcação dos exemplares adultos e juvenis ou mesmo na identificação e respectivo seguimento por GPS).

Uma imagem das duas crias já juvenis nascidas na Tapada de Mafra
A Águia-de-Bonelli, a Águia-Imperial-Ibérica, a Pardela-Balear, o Lince Ibérico, o Lobo Ibérico, A Foca-Monge (ou Lobo-marinho), as 27 espécies de morcegos ou o Salmão, entre tantas outras… merecem que levemos a sério todas estas questões sobre a conservação e a preservação das espécies que este artigo sobre a magnifica Águia-de-Bonelli procura levantar.

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