A DOG NAMED... MABECO (AFRICAN WILD DOG)!
O "CÃO-SELVAGEM" OU CÃO-CAÇADOR AFRICANO
Lycaon pictus, é o nome científico dado em 1820 a esta espécie.
Mabeco! Mabeco é o nome que escolhi para esta espécie extraordinária, entre tantos outros pelos quais é conhecido. O cão-caçador, cão-selvagem africano, lobo malhado, cão-hiema ou mua muitu como é designado na língua suaíli; são alguns dos outros nomes pelo qual é também identificado.
A minha relação com o Mabeco tem perto de quarenta anos, por incrível que pareça. Este foi o primeiro animal pela qual me fascinei quando tinha cerca de 13, 14, 15 anos... Já não me recordo bem. Estudei na altura toda a pouca documentação que tinha disponível, como segui maravilhado os documentários nessa altura sobre este magnífico animal. Até aos dias de hoje, sempre guardei dentro de mim uma empatia impar por este canídeo.
Para perceberem ainda melhor a profunda relação que tenho por este animal, conto a título de curiosidade um facto que poderá evidenciar estas minhas primeiras palavras sobre o Mabeco... quando era ainda um muito jovem adolescente, um professor de trabalhos manuais pediu-me para fazer um trabalho em madeira à minha escolha... para surpresa dele, escolhi fazer um escultura de uma cria dum Mabeco, nome do qual ele nunca tinha ouvido falar... confesso, que me saiu muito bem. Perto da perfeição nas mãos de um míudo.
Infelizmente, só pouco mais de três ou quatro vezes estive perto deles ao vivo. Sempre no Jardim Zoológico de Lisboa, e a última vez foi já há bastantes anos atrás. Hoje em dia, este parque zoológico não tem nenhum exemplar desta espécie. Oenso que o único lugar onde puderemos ter um encontro (que considero: único) com este animal... é no Zoo Santo Inácio, em Vila Nova de Gaia, a cerca de 10 minutos do Porto.
Infelizmente, só pouco mais de três ou quatro vezes estive perto deles ao vivo. Sempre no Jardim Zoológico de Lisboa, e a última vez foi já há bastantes anos atrás. Hoje em dia, este parque zoológico não tem nenhum exemplar desta espécie. Oenso que o único lugar onde puderemos ter um encontro (que considero: único) com este animal... é no Zoo Santo Inácio, em Vila Nova de Gaia, a cerca de 10 minutos do Porto.
Mabeco vem de mabeku do quimbundo (Kimbundu), língua usada no noroeste de Angola. Plural de dibeku, que vem a partir de ku-di-beka. Uma referência à natureza deste carnívoro, devido à perseguição que move às suas presas.
O Mabeco ou cão-caçador, pertence a Classe dos Mamíferos. À Ordem dos Carnívoros. À Família dos Canídeos e à sub-Família dos Simocioníneos. As outras duas sub-Famílias que dividem este grupo são: Caníneos (de que fazem parte, por exemplo, as raposas) e Otocioníneos (da qual faz parte o otócion).
Olhando para este "cachorro" que nos faz lembrar um pouco algo parecido com o cão, não podiamos estar mais errados. A sua taxónomia diz que está tão longe dos cães como está dos lobos. A sua anatomia, para além de alguns pormenores, difere numa caracteristica que o fizeram incluir num género à parte... a falta de um quinto dedo nas patas anteriores. Foi apenas o seu inconfundível aspecto canino que levou ao nome de cão-caçador ou cão-selvagem africano... caçador, devido à condição errante enquanto matilha que esta espécie adoptou.
Em termos anatómicos, este animal possui algumas caracteristicas singulares que o diferem dos outros canídeos. A mais evidente são as enormes orelhas erectas e arredondadas. Com olhos cor de âmbar, o seu crânio é maciço e pesado devido ao desenvolvido aparelho mastigador de poderosas maxilas suportados por fortes masseteres; um músculo de grande espessura que suporta lateralmente as mandíbulas. Com pêlo curto nos membros e no tronco possui pelos fartos no pescoço, e a pelagem malhada é outra das especificidades desta espécie. Provavelmente não deverá existir um exemplar exactamente igual a outro. A coloração das manchas varia desde o branco à cor de ferrugem, e acastanhada, como do negro ao amarelo-avermelhado, terminando com parte da extremidade da cauda num tufo de pêlo branco; um perfeitamente identificador deste animal, que serve também de orientação aos elementos da matilha para se localizarem uns aos outros ou como "bandeira" cerimonial de paz. As únicas caracteristicas comuns entre os indivíduos desta espécie é uma marca negra longitudinal na testa até ao focinho e o pescoço preto. São animais, como todos os canídeos, dotados de um apurado olfacto e uma excelente audição. Com um comprimento da cabeça e do tronco de cerca de 145 cm, e um comprimento de cauda de 35 cm, tem uma altura até ao garrote de 60 a 75 cm. O peso ronda entre machos e fêmeas dos 27 aos 36 kg. Com uma média de vida entre os 10 e os 12 anos, em cativeiro podem chegar atingir os 14 anos. A gestação das fêmeas situa-se entre os 60 e os 80 dias, com uma média mais fixa entre os 70 e os 72 dias. Podem procriar durante todo o ano, porém o período mais frequente de reprodução ocorre entre Maio e Junho. As ninhadas variam muito, consoante a densidade de presas disponíveis, contudo; os estudos relatam de 2 a 6 em épocas de escassa alimentação, de 10 a 12 ou até 16 crias se a caça for muito favorável à evolução das matilhas. Os juvenis têm formas arredondadas, pêlo escuro e uniforme, as orelhas são semicaídas, e muito dependentes até cerca dos 16 e os 24 meses.
Entre alguns dos naturalistas que estudaram os cães-caçadores, houve um que me marcou desde o primeiro momento: o barão Hugo Van Lawick (10 de Abril de 1937 - 2 de Junho de 2002), escritor e famoso naturalista, fotógrafo e realizador, importante conservacionista holandês, nascido em Surabaya na Indonésia. Tornou-se um cohnhecido defensor da vida selvagem com os seus estudos sobre os chimpanzés, altura em conheceu Jane Goodall no Gombe Stream National Park; o mais pequeno dos parques naturais da Tanzania, com quem veio a casar e a divorciar-se posteriormente. Autor do famoso documentário "People of the Forest" que estudava uma família de chimpanzés, que mais tarde seria acompanhado ao longo de décadas por Goodall. Este naturalista influenciou em definitivo o meu respeito e carinho especial pelos animais e por toda a vida selvagem. Não falei dele no meu tributo a todos os que pesaram sobre esta minha paixão, porque quis inusitadamente dar-lhe um destaque próprio neste artigo.
Como podemos ver nestas duas imagens: |
Uma importante ninhada nascida em 2011 no Zoo de Brookefield em Illinois, nos EUA. |
Os grupos variam igualmente muito no número de exemplares. Hoje, devido ao facto de ser também, uma espécie em risco de extinção, os bandos são menores e com densidade populacional perigosamente reduzida. O povoamento geográfico, que antigamente se estendia quase por toda a África, está condicionado a pequenos fragmentos territoriais entre regiões do centro africano e a parte mais norte do sul de África. Todavia, os estudos mais prolongados feitos no Ngorongoro e no Serengeti dizem que estes grupos podem ainda variar próximo de uma dezena ou um pouco mais e perto de 20 animais adultos. Hoje como estão reduzidos a poucas zonas geográficas da Africa sahariana, o delta do Okavango, é um dos símbolos da sua preocupante sobrevivência. Sabe-se no entanto que antes de se encontrarem ameaçados como estão, havia relatos de bandos errantes com perto de 40 indivíduos.
Em termos etológicos, o Mabeco é um dos casos mais singulares da sociologia em grupo da vida selvagem. A sociedade destes animais é composta em geral por um número predominante de machos normalmente aparentados entre si, e apenas algumas fêmeas também com um parentesco entre elas, contudo provenientes de outras matilhas, o que permite a diversidade genética e evitando os imponderáveis da consanguinidade dos cruzamentos. O par alpha é dominante, e é esta fêmea por regra que é a progenitora da maioria das crias, mesmo não sendo invulgar que as outras fêmeas sejam cobertas pelo macho dominante e possuirem a sua própria prole. Mas isto não invalida que os cuidados pelos membros do grupo não se dividam por todos os elementos. As crias são criadas como se pretencessem todas às mães gestantes, respeitando no entanto o privilégio da fêmea alpha. Há histórias em que a única destabilização que se conhece no comportamento destes carnívoros é a disputa das fêmeas para tomarem conta de todas as ninhadas, acabando invariavelmente por fim aceitarem a partilha das responsabilidades entre as restantes fêmeas, mas é uma situação que ocorre apenas em grupo numerosos. Por sistema, é a fêmea dominante que toma conta das suas ninhadas, ficando à porta do covil tomando conta das crias até que o grupo regresse das caçadas, não sendo raro que um ou dois machos menos vigorosos, mais jovens ou debilitados permaneçam também com ela nas imediações. São animais que gostam de sentir o conforto junto dos outros membros do grupo e é normal vê-los dormir enrolados ou amontoados em cima uns dos outros. As matilhas em épocas de grande diversidade de alimentação tornam-se menos nómadas e por isso permanecem em territórios de caça com extenções que não excedem muito os 50 km2, quando a situação se inverte e a escassez de comida é maior podem cobrir áreas de 150 a 200 km2. Mesmo perante estas dimensões geográficas evitam de introduzir nos territórios vizinhos de outras matilhas.
Como caçadores, são temidos por grande parte das espécies de hervívoros ou grandes ungulados, desde os grandes aos mais pequenos. O Mabeco consome uma média de 3 kg de carne por dia, o que obriga estes animais a empreender em determinadas situações pelo menos duas caçadas durante o dia. Normalmente escolhem as horas do amanhecer ou entardecer já quando a noite cai, evitando os períodos em que os grandes predadores estão em actividade, tal como os leões ou as hienas-malhadas, considerados os seus inimigos, tanto pela capacidade de lhes roubarem as presas como pela prórpia ameça que representam para as crias ou membros adultos do grupo, mas onde se incluem ainda os leopardos e mesmo as chitas ou chacais. As principais presas são habitualmente os animais mais vulneráveis e aqueles que mais facilmente conseguem isolar dos bandos, apesar de se considerar as suas perseguições e desfechos extremamente violentos, estes animais selecionam muito bem os alvos; as crias recém-nascidas, os mais jovens nascidos nesse ano, velhos ou doentes, líderes já no limite de tempo das suas predominâncias territoriais... o que obviamente não é um comportamento idêntico a todos os outros grandes caçadores das savanas e planícies africanas. Dado serem canídeos, com uma grande capacidade perseguidora, estes animais esgotam as vítimas pela exaustão, pelo esgotamento, criando uma dormência quase inconsciência nas suas presas, provocando de seguida uma morte muito rápida, fazem-no rápido para garantirem o sucesso da caçada e depressa desaparecerem dos espaços abertos e regressarem para junto do covil. Em tempo de grande abundância, a alimentação fica mais garantida pelas enormes manadas de gnus e zebras ou bandos razoáveis de antilopes um pouco maiores, isto acontece durante o mês de Fevereiro, já depois de a última gestação ocorrida entre Dezembro e Janeiro, quando os jovens já conseguem seguir com as manadas. Nos períodos do ano em que as presas são menores, depois das migrações anuais, o Mabeco prefere caçar os pequenos hervívoros como impalas, a gazela de Grant ou a gazela de Thompson e outros antílopes menos numerosos, só em situações extremas optam por perseguir javalis, pecaris ou ainda mamíferos mais pequenos.
Com uma técnica de caça impressionante, estes animais são capazes de atingir velocidades de 48 a perto de 60 km/h, com uma resistência que pode prosseguir a uma velocidade de 35 km/h durante mais de três km. As movimentações fazem-se a céu aberto com a matilha visível e próxima dos alvos da sua caçada, caminhando a passo com paragens ordenadas entre os seus membros que prescutam a região em todas as direcções selecionando cuidadosamente a sua vítima. A caça começa por inciarem uma marcha a trote até se aproximarem o mais possível da presa, encetando de repente uma perseguição a alta velocidade controlada por todos os elementos cercando gradualmente o alvo após o lider da caçada levar ao cansaço a presa escolhida. A morte é rápida.
Algumas das curiosidades que caracterizam este animal tão maltratado pelas autoridades responsáveis, tanto a nível governamental e como mesmo por aqueles que nestes territórios são responsáveis pela segurança dos parques naturais... e que permitiram que fossem caçados e odiados até quase à sua extinção, que esteve eminente há pouco mais de duas décadas... ainda hoje, 20 anos depois, o seu risco continua a ser elevadissimo... calcula-se que não deverão existir muito mais do 6.000 exemplares em estado selvagem. Só um sério empenho de todas as autoridades e responsáveis envolvidos pode controlar o destino trágico que ameaça esta espécie. Protocolos que têm obrigatoriamente que passar, por acordos com as populações locais, no controle da expansão desgovernada dos terrenos agrícolas, da proliferação de estradas, na criação de corredores naturais e despovoados para que possam livres... percorrer os seus territórios sem o perigo de se confrontarem com os humanos... aqueles que acabam por ser, invariavelmente, os seus piores predadores.
Hugo Van Lawick com Jane Goodall |
Outras notas curiosas sobre o Mabeco, é a forma como eles alimentam as crias e os jovens. Através de estímulos provocados pelas lambidelas no focinho, este animal regurgita a comida degerida após as caçadas facilitando a digestão dos mais pequenos. Por vezes, esta comida é engolida e de novo regurgitada por outros membros do grupo... a que os naturalistas chamaram a esta acto: estômago comum. Esta encenação, como em muitas outras relações no grupo, é precedida de um espectáculo de sons que poderiam se assemelhar a latidos mas soam mais a gemidos. Outra caracteristica importante na relação e nos laços estabelecidos vêm das suas glândulas odoríferas com um odor doce, peculiar e persistente, extremamente útil no contacto e na forma como mantêm ligação aos membros do grupo. São uma sociedade que se diverte e participa alegremente nas brincadeiras das crias ou dos mais juvenis. Os seus covis não são feitos por os próprios, aproveitam-se dos já existentes e abandonados pelos oricteropos, facocheros ou hienas, essa pouca dedicação resulta do seu processo errante e nómada. É de admirar a partilha e o cuidado com que se preocupam que todos comam, manifestando claramente que a sobrevivência do grupo é superior à do indivíduo...
Temos na realidade muito à prender, e por incrível que pareça é nestes pequenos factos da vida que vemos que falta-nos um longo caminho para sermos na verdade dignos de respeito.
Born to be wild...
Obrigado pela informação que o seu artigo me proporcionou.
ResponderEliminarHenrique Moura