Todas estas notícias, deixam-me
impressionado, para além da revolta que sinto quando penso na raça-humana e
naquilo que o homem é capaz de fazer em prol do seu interesse pessoal e em prejuízo
grave e dramático dos “outros”. E não me venham dizer, que é a necessidade de
sobrevivência ou a luta desesperada pela subsistência perante a imensa pobreza
ou a agonia da dificuldade; pois nada justifica a crueldade e a desumanidade
com que tratamos os outros, e principalmente, aqueles mais vulneráveis e
indefesos. É esta desproporcionalidade de forças que subjugam pela bárbara
maldade todos aqueles que se encontram numa posição inferior e mais fraca, que
me faz desprezar uma parte da espécie humana.
A notícia que surgiu no dia 4 de
Março deste ano, na maioria da comunicação social e no noticiário online, sobre mais um atentado à
natureza, mais uma tentativa de golpe na vida selvagem, o malfadado crime
organizado… traz-me uma vez mais, ao pensamento, que a permissibilidade da
justiça com quem age criminosamente, e sem qualquer sentimento, contra os mais
desfavorecidos, continua a coberto da impunidade ou sujeito a penalizações
ridículas, quando a evidencia é clara na violação da lei, no maltrato e na sujeição
a uma morte atroz ou no mínimo à privação da liberdade de seres manifestamente indefesos, e isto para regalo de
seres-humanos oportunistas… são factos como estes que deviam ter como
consequência imediata, uma punição internacional exemplar do Estado em questão
onde ocorrem estas situações.
Mais de 1500 tartarugas vivas encontradas…
Neste caso, as Filipinas e a
China! Até porque é recorrente, nestes países. E o dia 3 de Março de 2019, mostra
mais uma vez isso. O aeroporto internacional Nimoy Aquino, em Manila, foi palco
de mais uma visão da ignóbil natureza humana. 1529 tartarugas vivas, de
diversas espécies, incluindo cágados, Tartarugas-de-orelha-vermelha (que estão entre as 100 espécies exóticas mais invasivas) e alguns exemplares de uma espécie em vias de
extinção como a: Tartaruga-de-espora; foram encontradas, em bagagens não
reclamadas, embrulhadas em fita adesiva (como se pode ver na imagem
disponibilizada).
O individuo responsável pelo
embarque desta "carga", é um filipino, que procedeu ao seu despacho em Hong-Kong.
A pena “severa” é estimada no máximo a 2 anos de prisão ou eventualmente, ao
pagamento de uma fiança de 3.400 euros. O fim destes animais, varia consoante o
mercado do crime: como iguarias gastronómicas de restaurantes livres pela
cumplicidade ou benevolência da justiça, o uso dos seus corpos para fins de
práticas da medicina tradicional oriental ou para colecionadores de animais
exóticos. Um tráfico ilegal que poderia ter rendido cerca de 70 mil euros, se tivesse
sido consumado.
O individuo foi detido? Qual a
pena a que foi sujeito? Houve outras detenções ou consequências? Não sabemos,
essa é a parte da notícia que parece não ser relevante, nem qualquer nota de
referência a esta preocupação, nem que fosse à posteriori…
Pelo menos estes animais foram salvos
e entregues ao departamento de meio ambiente e recursos naturais, a uma unidade
de monitorização de tráfego da vida selvagem, em Manila. É verdade, que as
autoridades agiram. É verdade que, desta vez, a fiscalização, funcionou. Tal
como ocorreu, em situações semelhantes em 2018, com apreensão de 560 animais
selvagens. Porém, o problema subsiste; as medidas não são suficientemente
punitivas e dissuasoras para evitar ou mitigar o impacto que o tráfego ilegal
produz na natureza, principalmente, na vida selvagem e nas espécies ameaçadas.
E os culpados são acima de tudo os países, pelas leis permissivas e
complacentes; depois, a comunidade internacional e os organismos oficiais
internacionais por não agirem com leis penais vinculativas e imporem
consequências drásticas aos países envolvidos nestas operações.
No fundo, a questão que se põe é…
Porque é que a lei não ajuda? Porque
não se faz jurisprudência sobre os atentados ao património natural universal?
Porque não se usa um princípio,
semelhante ao de Kant, à cerca da vida humana (algo muito próximo ao seu pensamento: “… cada ser humano é digno de respeito por ser um ser racional;
este respeito significa reconhecer a vida humana como um fim em si mesmo, e não
como um objeto para uso de outrem…”), mas reflectindo esta máxima na vida animal,
talvez como um fundamento para um Direito casuístico onde a lei e a legislação fossem
o princípio da representação jurídica da dignidade da vida dos animais e dos
seus direitos fundamentais.
Se queremos realmente, proteger o
planeta com coragem, com autenticidade, com consciência efectiva… ainda que extemporaneamente,
eu proponho, que se crie um TPI (Tribunal Penal Internacional) com competência para
julgar e punir aos olhos do mundo quem atente contra a natureza e a
biodiversidade planetária, com base em pressupostos similares aqueles que são
usados nas competências do Tribunal de Haia. Pode parecer um exagero desmedido
pela consideração dos factos em causa, mas não é! Como sabemos e hoje assumidamente,
inegável, é o equilíbrio e a sustentabilidade da vida na Terra, e da própria
humanidade, que está a ser afectada cada vez que se comete um crime idêntico a
este, e a Comunidade Internacional tem a obrigação universal de assumir de vez
o seu papel responsável na protecção ambiental global, assim como todos nós...
Filipe de Figueiredo
(investigador
e conservacionista na MWR/Mecafilme Wildlife Research)
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